quarta-feira, 2 de junho de 2010

(NÃO!) me vou embora para Pasárgada, 'tá dito...

Não sei se éramos 299 mil ou 301 mil. Mais de 150 mil éramos, porque uma ex-contadora (o que é isto?...) o disse, com a sua experiência e a vontade de "prestar serviço" (... de ex-tra).
Não sei se éramos 299 mil ou 301 mil. Sei que, de Viana do Castelos, eram 11 autocarros e de Santarém 22, isso sei. E sei que éramos muitos, muitos, muitos mil.
Não sei se éramos 299 mil ou 301 mil. Sei que, de certo, não estava ninguém que não quisesse estar, que, de certo, ninguém estava à procura de carreira, de tacho, ou de favores do poder (seja ele aparente ou real, divino, político-partidário ou financeiro).
Sei, também, que quando, por aqui-por ourém, vejo coisas destas fico "pior que estragado", decido não reagir ao desrespeito pelos outros, à intenção ofensiva, à ausência de democrati-cidadania, à baixa provocação... mas não resisto. Lembro-me do Manuel Bandeira e...
NÃO me vou embora para Pasárgada!

Vou-me Embora pra Pasárgada

Manuel Bandeira

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar


E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada.


Texto extraído do livro "Bandeira a Vida Inteira", Editora Alumbramento



1 comentário:

tiagogoncalves disse...

ahh.. Pasárgada, Sérgio, não sabia que a palavra tinha sido usada assim dessa maneira.. pensava que só o Pedro a suava.. hihi

mas pronto.. e sim, fiquei impressionado e sensibilizado com a capacidade de mobilização que esta manif teve.. quanto a números, são números.. mas vejamos, para Portugal, onde tudo é amorfo - mesmo no que toca a questões de justiça social - 50 mil já teria sido um excelente numero!.. não estive lá - infelizmente não pude estar em Lisboa -, mas as imagens são claras.. passava certamente das duas centenas de milhar, isso é certo. e se, pro hipótese, for esse o numero - assim em contas de guardanapo - é capaz de dar qualquer cosia como dois por cento dos portugueses que, no mínimo, estão um pouco aborrecidos com o que se está a passar. acho que é a leitura mínima que se pode fazer. só não faz essa leitura quem não quer.. e se não quer, olha, é como o outro, temos pena.

abraço,
t